Actividade Paroxística

sábado, 24 de janeiro de 2015



Abram as portas
Abram as portas que queremos passar
E somos muitos
E temos pressa
Abram as portas!
Abram as portas que já não nos suportamos
Cá dentro
A sós com o nosso pesado silêncio

- Attention à la marche en descendant du train -

Saímos de cotovelos dados
De ombros colados
Uns aos outros
E somos muitos
E temos pressa
Somos a criança de gorro amarelo
Que baloiça nos olhos da mãe
Somos a sua fome e o seu pranto
A sua insegurança
Somos o velho que esqueceu
Os olhos no passado
E não voltou
Somos O Estrangeiro de Camus
Nas mãos de alguém
A tristeza mascarada no rosto da avó
- Há quanto tempo não vês a tua avó?
Somos a palavra que se move na distância
A inquietação do cigarro
Que aguarda o fogo da língua
Somos o relógio do teu pulso,
Quanto tempo falta para chegar à superfície?
Somos muitos
E temos pressa
Falamos uns com os outros
- Pardon, excuse-moi
Somos a relação subterrânea
O dia que correu mal
Um pedido de desculpas que não é senão
Para nós
Por não termos feito melhor
Somos a preocupação com o jantar
Courgette ou beringela?
E o telefonema que procura
O colo na voz de alguém
Somos o cansaço do trabalho
O medo de existir
Abram as portas
Abram as portas que queremos ver se está sol
Saímos de cotovelos dados
De ombros colados
Não sabemos sequer se chove
Nas ruas de Paris
Aqui em baixo está escuro
- Trouxeste o guarda-chuva?
Somos os passos frenéticos
Na travessia dos não-lugares
Os bilhetes, as portas
Os bilhetes, as portas
Os bilhetes!
Não compro bilhetes por não ter dinheiro
Somos o salto em altura
Por cima da cancela
O movimento olímpico da transgressão
Somos muitos, temos pressa e vamos juntos
à procura da página onde se respira.

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